sábado, 13 de março de 2010

Véspera de exílio

Neusinha Brizola e eu nos reunimos esta semana passada em Montevideu, ela precisava fazer seus negócios e aproveitamos para escrever o primeiro capítulo contando a vida dela no exílio com seus pais e irmãos.

Fizemos um tour por seu passado. Fomos também a praia de Atlântida perto de Punta para recordar os anos que ali morou com sua família. Foi bastante emocionante.



Escrevemos o primeiro capítulo de seu livro

Véspera de exílio.



Não estava entendendo nada daqueles rumores dentro de casa e dos correligionários do meu pai. Ele não estava em casa.




Pelo jeito, minhas primas mais velhas e minha mãe estavam preparando mais um sarau, como gostavam, à tardinha.




Certamente teria bôle, bebida que gostavam de servir em boleiras de cristal.


Eu brincava distraidamente com minhas bonecas.

Não teve bôle. O ambiente parecia tenso.

Começaram a chegar as tias que moravam em Porto Alegre, os maridos e as outras primas.

Meu pai havia desaparecido.

Dormi como uma princesa e acordei como uma sapa. Talvez esta fora a última noite bem dormida.

Toda a rua estava cercada com bunkers e metralhadoras. O que dava muito medo era ver os militares fardados junto aos carros de guerra.

Aquilo era uma guerra?

Vivia com meus pais e meus irmãos, uma família, para mim, perfeita.

Nesta dia, meu pai não retornou.

Chegavam em casa como arautos os homens que trabalhavam para o governo do Estado, vinham cada um com uma notícia diferente sobre o meu pai.

O alvoroço era tanto que eu não tinha discernimento para compreender a situação.

De repente me vi sem casa, morando na casa da Tia Landa, irmã mais velha de minha mãe, minha madrinha.

Uma casa muito alvorotada, por ela ter muitos filhos. E ainda tinha meus dois irmãos: João Otávio e José Vicente.

O tempo passou... Meu pai desaparecido e nós continuamos morando na casa da Tia Landa.

Suspeitava que minha mãe encontrava com o meu pai escondido. Meu primo Juca cada vez que minha mãe e minha tia Landa saíam sozinhas, parava no portão da rua Luciana de Abreu e berrava:

- Suas putas!!! Vagabundas, já vão sair!

Eu adorava, só não gritava igual a ele porque não me encorajava, também tinha pena da minha mãe que chorava o tempo todo.

Sendo que em alguns dias fomos para o exílio, com meu pai ainda desaparecido.

Entramos no pequeno avião Constellation, minha mãe, eu, meus irmãos, quando minha mãe foi chamada pelo general que nos tinha acompanhado até lá. Ela não quis sair do avião sem nós. Quando o general falou: "O seu reinado acabou", ela disse para ele: "Aqui começa o seu".

Se quiserem saber mais sobre a história, leiam o meu livro que estará nas livrarias, vocês saberão!

E... não é mintchura!

Meu pai sempre dizia: "Minha filha, você é a ovelha negra da família", e eu? Confio em ti.

Sei que dei bastante trabalho para eles, mas como sair ilesa de uma situação como esta?

No exílio ainda com o pai desaparecido, cada dia vinha da fronteira, uma notícia diferente.
Várias vezes choramos a morte dele, ainda tinhamos que dar forças para nossa mãe, que estava inconsolável.

Minha tia Silla, que também estava exilada por conta de meu tio João Luiz Moura Valle,
um grande jornalista político da época. Ela começou a vender pedacinhos de terra no Brasil, para nos sustentar à todos.

Pagava nossas escolas, comida, enfim até motorista para nos levar ao colégio.
ficamos completamente sem dinheiro;

Meu primo predileto era o Vivi, que nesta época mesmo começamos a fazer as primeiras
aventuras juntos.


Meu pai também dizia rindo, quando falava de mim e do meu querido primo e amigo para sempre Vicente (apelido Vivi) e eu Neusa Maria (apelido Bahia)


"A Bahia e o Vivi quando se juntam não se somam, se multiplicam"

Hoje conto os momentos bons e maus que passei junto a minha família.

Não esqueçam, me leiam.


Neusinha e eu, primeiro fomos a Montevideo para ela fechar negócios com seu irmão João Otavio, chegamos na quarta e na quinta ainda fomos jantar com seu irmão e seu filho João Eduardo. Fomos a um restaurante alemão maravilhoso, riquíssimo em calorias! No outro dia de manhã foi nos buscar um remis e partimos para Punta Del leste, passamos no caminho em Atlântida. Depois desta visita rumamos a Punta onde ficamos até o sábado entre tomar um solzinho e visitar antigos restaurantes da época de seu tio João Goulart. Fizemos um festival gastronômico cujo restaurante melhor foi este das fotos que se chama Scarlat.



2 comentários:

Carla Volkart disse...

Minha geração agradece por finalmente alguém se dispor a contar este lado da verdade, e de forma tão legal. Ficamos 50 anos tentando montar um quebra-cabeças com peças faltando. Os psicólogos e principalmente os psicanalistas com certeza viveram esse tempo todo fazendo fortuna disso. Vamos gerar emprego!!! Mas por mais "paciente" que a gente seja, é um saco não conseguir nunca completar a imagem real em nosso cérebro tão simpático e para-simpático. Obrigado garotas! Neuzinha e Marta são minhas ídalas atuais, só dividindo espaço com...Barbarella (1968)!!! Carla Volkart

Marta Schönfeld disse...

Nara Lisboa Li e de novo, adorei! quando sai o livro Martha? quero!
beijos alegres minha querida e continue nos delciiando com estes textos hisoricos e cheios de emoçao!
há 3 horas ·