sábado, 4 de fevereiro de 2012

IGREJAS – NOVA CARTA AO OSMAR

Paulo Wainberg

         O Osmar, você sabe, é o meu correspondente que não responde nem corresponde. Dele eu sei apenas que tem em torno de sessenta anos, solteirão convicto ( não é gay), barrigudo e bebedor de cerveja.
         Ultimamente, de ouvir falar, consta que talvez seja torcedor do Internacional de Porto Alegre, não sabe se é contra ou a favor do PT, ainda não decidiu se gosta ou não do Fernando Henrique Cardoso e detesta, como todo o Brasil, salvo Maranhão e Amapá, o Sarney.
         Ele jamais respondeu minhas cartas e seria verdadeiramente intrigante se ele respondesse, visto que não passa de um personagem que eu inventei.
         Se um dia receber uma carta do Osmar, passarei a acreditar definitivamente na metalinguagem e fundarei uma Igreja, que se chamará Igreja Metódica dos Primeiros Minutos Metalingüísticos, cujo lema será: “Use as palavras com amor que ‘ele’ lhe fará um favor.”
         E quando meus adeptos e fieis, inclusive os bispos, pastores e revendedores, digo, reverendos, me perguntarem quem é ‘ele’, responderei:
         - Bote seus bens e sua conta bancária no meu nome que ‘ele’ se revelará a você.
         Enquanto isto e esperando, sinceramente, não receber nenhuma carta do Osmar, vamos à minha carta para ele.
        
Querido Osmar.
         Espero encontrá-lo e a todos os seus possíveis seus, em plena paz, curtindo o Nordestão das praias gaúchas, o mar gelado e os engarrafamentos, desejando sinceramente que ainda não tenha sido assaltado.
         Escrevo para que você me ajude a entender como, neste mundo de Deus, ainda tem gente que acredita em seitas, cultos, religiões, igrejas e outras coisas mais.
         A gente liga a TV num desses programas religiosos (não vou citar nomes por motivos éticos, mas tem de tudo) e vê o sujeito, com o maior desplante deste mundo, dizendo sorridente à multidão na platéia
          “hoje de manhã Deus me deu um puxão de orelhas, porque ontem eu esqueci, durante o culto, de mostrar a vocês este DVD que acabamos de lançar, divulgando a palavra de Nosso Senhor e que está a venda, por apenas dez reais. Deus me puxou a orelha com força, tanto que cheguei a me arranhar, bem aqui no pescoço, quando fazia a barba. Por isto, e para me redimir com Jesus , Amém , nossos ministros percorrerão agora as fileiras e vocês podem adquirir esta pequena maravilha, a cores, som dolby digital, como o que há de mais moderno na tecnologia que Deus nos oferece. Você compra por apenas dez reais e, logo que terminar o culto, pode ir para casa, feliz e com o coração impregnado de Cristo, para assistir o filme e comungar”
         É impressionante, querido Osmar, mas a multidão compra o tal DVD que deve ter custado quase nada, para ver o mesmo sujeito repetir as coisas que eles estão vendo e ouvindo ao vivo.
         Eles falam de Deus com uma intimidade impressionante, apresentam problemas comuns na vida real que se adaptam à passagens da bíblia e ‘resolvem’ esses problemas com citações de versículos que são depositados, na mente dos pobres crentes, como verdades absolutas e literais.
         Será que as pessoas não percebem que estão sendo lesadas, roubadas, espoliadas, enganadas? A fraude é tão evidente, tão primária e gritante, que não consigo entender como existem pessoas que se submetem à ela, com alegria e devoção.
         E não estou falando de gente simples ou ignorante. Não, Osmar, pessoas instruídas, com boa capacidade de reflexão e entendimento, sucumbem às palavras mágicas e aos milagres ridículos de curas espetaculares e depoimentos óbvios que, ao simples ver, percebe-se foram ensaiados.
         Eu quero deixar claro, Osmar,  para não enfrentar suas convicções, caso você tenha alguma, que sou plenamente a favor da liberdade religiosa, inclusive o ateísmo. Acho que crença e falta de fé são questões de foro interno individual, embora nenhuma crença resista ao mínimo argumento racional, se não apelar para o irracional.
         Seja. Cada um acredita no que quiser e professa a religião que quiser.
         O que não posso aceitar, nem entender, é que em nome da fé se pratique o estelionato, a extorsão, promovendo a riqueza dos proprietários da igreja.
         A pergunta que eu gostaria que você me respondesse, querido Osmar, porque ninguém do mundo real consegue me responder, é por que razão as autoridades permitem tal procedimento, por qual motivo o nosso – que Deus me perdoe – Congresso não edita leis coibitivas e punitivas para esses procedimentos.
         Eu tenho, cá comigo, uma suspeita e que ninguém além de nós dois fique sabendo dela: Não será porque essas igrejas têm muito dinheiro para fazer propaganda na mídia e, também, porque tem até uma bancada com nome próprio no, desculpe, nosso Congresso Nacional, no nosso Executivo e no nosso Judiciário?
         Hein?
           

Nenhum comentário: