sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O VALIOSO TEMPO DOS MADUROS




Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui
para frente do que já vivi até agora.
...

Tenho muito mais passado do que futuro. Sinto-me como aquele menino
que recebeu uma bacia de cerejas. As primeiras, ele chupou
displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.

Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em
reuniões onde desfilam egos inflamados. Inquieto-me com invejosos
tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos
e sorte.

Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir
assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.

Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar
da idade cronológica, são imaturos. Detesto fazer acareação de
desafetos que brigaram pelo
majestoso cargo de secretário-geral do coral. As pessoas não debatem
conteúdos, apenas os rótulos. Meu tempo tornou-se escasso para debater
rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa...

Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana,
muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com
triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua
mortalidade.
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade.
O essencial faz a vida valer a pena.

E para mim, basta o essencial!

Mario de Andrade (1893 - 1945)

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