segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Critica FILM SOCIALISME em O ESTADO DE SP, O GLOBO e FOLHA DE SP

Abaixo a devida cobertura ao filme de GODARD que completa 80 anos
em total esquecimento por alguns jornais de Porto Alegre,
excetuando o JORNAL DO COMÉRCIO e O SUL.
Aqueles que noticiaram através de outros meios agradecemos:


'Film Socialisme', obra-prima de Godard estreia nas telas
Gênio da nouvelle vague faz 80 anos, com lançamento de DVD e homenagem da Academia de Hollywood
03 de dezembro de 2010 | 6h 00
Luiz Carlos Merten - O Estado de S. Paulo
http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,film-socialisme-obra-prima-de-godard-estreia-nas-telas,648579,0.htm


Para quem conhecia o cinema engajado e humanista de Mario Monicelli, parecia impossível que um dia o diretor de Os Eternos Desconhecidos, Os Companheiros e O Incrível Exército de Brancaleone fosse se matar. Da mesma forma, Jean-Luc Godard, ao surgir, virou a própria personificação da nouvelle vague. A nova onda foi uma reação aos velhos que dominavam o cinema francês.
Cena de 'Film Socialisme', que se passa em cruzeiro
Quem poderia imaginar o jovem Godard chegando à ‘melhor’ idade? Pois as duas coisas ocorreram, e na mesma semana. A semana comercial começou na segunda com Monicelli jogando-se do quinto andar do hospital em que estava internado. Chega a sexta-feira, com o aniversário de Godard, que hoje completa 80 anos.
Feliz aniversário, M. Godard! Para assinalar a data, a distribuidora Imovision coloca nas telas o novo Godard, que integrou a programação do Festival de Cannes, em maio. Film Socialisme não é apenas o melhor Godard dos últimos tempos - a verdadeira surpresa é constatar que Godard, aos 80 anos, e Manoel de Oliveira, aos 102, que completa este mês, são os que continuam inventando o cinema de ‘recherche’, o cinema de busca, o cinema autoral.
Citar (relacionando) os dois autores faz sentido porque Film Socialisme se passa durante um cruzeiro marítimo que também é uma viagem por centros formadores da cultura e do cinema universais. Não há como não se lembrar de outro cruzeiro, o que Oliveira empreendeu em Um Filme Falado. Ambos, por sinal, Godard e Oliveira, com todas as diferenças que os caracterizam, acreditam no verbo.
Godard prescinde de história, de personagens. É até meio difícil dizer do que, afinal, trata Film Socialisme. Digamos que, como todo Godard, é, acima de tudo, uma reflexão sobre o cinema.
Só sobre o cinema? Godard articula três movimentos para discutir a Europa do século 21. Em Coisas Como, durante uma viagem pelo Mediterrâneo, passageiros e tripulantes conversam em suas línguas (Oliveira já havia feito isso antes). Em Nossa Liberdade, um casal de irmãos exorta os pais para que lhes expliquem o significado de palavras (temas) como liberdade, igualdade e fraternidade. Em Nossas Humanidades, o autor revisita seis lugares fundadores de mitos, falsos ou verdadeiros - Egito, Grécia, Palestina, Barcelona, Nápoles e Odessa. Como o fio condutor é tênue, cabe aos espectador articular esses movimentos, retirando deles seus significados profundos. Duas constatações se impõem, talvez três.
Virulento. O filme é fluido, não evolui por rupturas. Um Godard mais sereno, sem deixar de ser virulento, como de hábito. Termina muito bem, e essa talvez seja a constatação mais impressionante. Godard projeta o espectador - cinéfilo - numa espécie de euforia, nos 15 ou 20 minutos finais. E ele continua singularmente crítico. Quer saber o que é o capitalismo, segundo Godard? Ele diz, no seu filme socialista, mesmo que indiretamente - "O dinheiro foi inventado para que os homens não precisem se olhar nos olhos." Hollywood? "É irônico que o lugar fundado por judeus seja chamado de Meca do cinema."
Um pouco da biografia ilumina o gênio. Godard nasceu em Paris, numa família perfeitamente burguesa - pai, médico, mãe pertencente a uma linhagem de banqueiros (como Walter Salles e João Moreira Salles no Brasil). O jovem Godard roubava do avô materno para pagar seus pequenos vícios juvenis, informa Antoine De Baecque em sua biografia, não autorizada mas não interditada, que saiu este ano. E, embora reverenciasse a alta cultura, não era exatamente estudioso - abandonou os estudos de etnologia na Sorbonne. Esses dados biográficos, o segundo, principalmente, têm alguma relevância na obra.
Por volta de 1960, avaliando o fato de os jovens da nouvelle vague fazerem filmes centrados no próprio umbigo, disse - "A honestidade da nova onda consiste em só falar do que sabe, para não falar mal do que não sabe, o que poderia comprometer o que sabemos." E logo em seguida, em 1962, numa entrevista para Cahiers du Cinéma, ele fez sua autocrítica - "Um filme sobre operários? Adoraria fazer, mas não domino o assunto." Muitos diretores, os chamados autores, dizem que filmam para descobrir o que não sabem. Francis Ford Coppola, na quarta-feira, em São Paulo, disse que o roteiro é sempre uma pergunta que ele tenta responder fazendo o filme. Godard não tem essa curiosidade, mas tem outras.
São 80 anos de vida e mais de 50 como diretor. Anarquista de direita, virou radical de esquerda. Revolucionou o cinema. Até Hollywood reconhece. Ele está sendo homenageado com um Oscar de carreira. Como iria recebê-lo numa cerimônia fechada, não na grande festa de março, não compareceu. Está certo. Não teria a mesma graça.
Film Socialisme - Direção: Jean-Luc Godard. Gênero: Drama (França-Suíça/ 2010, 101 min.). Cotação: Ótimo.


O Globo: http://rioshow.oglobo.globo.com//eventos/criticas-profissionais/film-socialisme-3729.aspx
Ruy Gardnier
Autorreconstrução radical
Dizem que quem é rei não perde a majestade. E quem fez questão de se opor às glórias da realeza, abandonando sistematicamente os louros do passado e apostando sempre numa autorreconstrução radical? Esses últimos, na maioria das vezes, caem do cavalo uma hora ou outra... Mas não Jean-Luc Godard. Sua genialidade é sua humildade: ele interroga cada imagem, por mais tola que seja, com a mesma curiosidade e a mesma generosidade. Essa espécie de “ética de trabalho”, por sua abertura ao novo e ao diferente, dá a seus filmes uma incrível força vital, e a sensação de ter sido feito por alguém com extrema jovialidade.
“Film Socialisme” é uma das reinvenções mais radicais de sua carreira, e Godard incorpora a seu cinema uma profusão de imagens amadoras contemporâneas, das feitas por telefone celular às câmeras de vigilância, passando por vídeos de internet e imagens digitais cheias de saturação. O resultado é desafiador: um verdadeiro bombardeio de fragmentos soltos, sons distorcidos em alto volume e inúmeras reflexões pinçadas de livros de Walter Benjamin, Hannah Arendt, Samuel Beckett e muitos outros. Aos que não quiserem seguir a viagem, o tédio é certo. Os que aceitarem as regras do jogo, porém, sairão da projeção eletrificados por um filme de grande impacto sonoro e visual, tensionando nossa percepção e provocando curto-circuitos de ideias e de ritmos.
É para levar a sério quando a sinopse afirma que o filme é “uma sinfonia composta de três movimentos”. Primeiro, porque “Film Socialisme” contém uma das edições de som mais ousadas da história do cinema, usando ostensivamente ruídos tidos como defeitos (como o barulho do vento no microfone) e fazendo uso radical das caixas laterais da sala de cinema. Segundo, porque é um filme que se presta mais à percepção do que à compreensão. É claro que há coisas que precisamos compreender (citações, jogos de palavras, referências a lugares e acontecimentos históricos, por exemplo), mas Godard age como um compositor ou um pintor, não como um palestrante.
As palavras na tela e as citações surgem como pinceladas em um quadro ou como notas musicais no seio de uma composição, ou seja, as ideias obedecem mais a uma dramatização do que a um discurso fechado. Em Godard, os conceitos são evocativos ou provocativos, jamais taxativos.
Cada um dos três “movimentos” têm seus próprios méritos, e é difícil destacar um favorito. O primeiro, passado num navio luxuoso com uma infinidade de personagens, é o mais radical em termos de montagem, com cortes abruptos entre imagens de natureza completamente diferente. A segunda parte, centrada numa casa de família e num posto de gasolina, produz pensamento a partir de golpes de nonsense e de humor surrealista. A parte final é uma montagem de imagens de arquivo (telejornais, filmes antigos, registros documentais e até jogo do Barcelona) em que o filme alcança seu clímax filosófico lírico.
Nem parece que já faz 50 anos que Godard revolucionou o cinema com “Acossado”. “Film Socialisme” é feito com a sabedoria de um veterano mas com um furor de iniciante.

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OPINIÃO JEAN-LUC GODARD
Cinema de diretor tenta dar conta de mundo fragmentado
DUAS COISAS MUDARAM: O APEGO SEMPRE CRESCENTE À FUNÇÃO DO CINEASTA COMO HISTORIADOR E O ISOLAMENTO PESSOAL

Cena de ‘Coisas Assim’, primeira parte de ‘Film Socialisme’
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
A atriz Anne Wyazemsky narra o que ocorreu durante a produção de "A Chinesa". Era 1967 e Jean-Luc Godard não tinha ainda nem metade dos 80 anos que completa hoje. Anne e ele já moravam juntos. E, no apartamento do casal, se davam as filmagens.
Com isso, acontecia de Anne ter uma briga com Godard à noite e, na manhã seguinte, ter de encenar a mesma briga para a câmera, com um ator no lugar do marido.
O exemplo, radical, ilustra a enorme proximidade que Godard estabeleceu entre seus filmes, sua vida pessoal e o momento histórico.
Foi sempre assim, desde o início, pois, embora "Acossado" (1960), filme de estreia, fosse baseado na história de um fora da lei, as semelhanças com o diretor eram muitas: ele também um amante de carros velozes e um rebelde capaz de roubar o caixa dos "Cahiers du Cinéma", a revista onde escrevia, ou de vender às escondidas um livro precioso do avô.
Nos outros filmes da década de 1960, essa proximidade é patente em diversos momentos: o musical "Uma Mulher É uma Mulher" (1961), momento feliz da gravidez de Anna Karina, sua mulher.
A perda do filho, antes do nascimento, determinaria não só o afastamento do casal e as várias tentativas de suicídio (de parte a parte), como a mudança de tom que se pode notar em, por exemplo, "Viver a Vida" (1962) ou ainda em "Alphaville" (1965), este talvez uma última tentativa de reconciliação do casal, embalado nos versos de "Capital da Dor", de Paul Éluard.
No começo dos anos 60, a política já está em "O Pequeno Soldado" (1963), que aborda a guerra de independência da Argélia, ou em em "O Demônio das Onze Horas" (1965), sobre o surgimento da sociedade de consumo. Mais tarde, a ascensão dos grupos esquerdistas surgirá em "A Chinesa".

PROJETO
Todo esse tempo, Godard manteve-se fiel a seu projeto de origem: a criação de um cinema que dê conta de um mundo desestabilizado, fragmentado, inapreensível à narrativa linear.
Não escreve roteiros, para melhor absorver o acaso e os movimentos do instante. Em política, adota progressivamente uma atitude hostil ao gaullismo e à Guerra do Vietnã, que desembocará no esquerdismo em 1968 e, em seguida, na renúncia ao "cinema comercial", no momento em que era uma estrela midiática em escala mundial.
Após anos de desaparecimento, Godard voltou às salas nos anos 1980 e entremeou sucessos e fracassos.
Duas coisas, porém, mudaram: o apego sempre crescente à função do cineasta como historiador, por um lado, e o isolamento pessoal, por outro. Montou na Suíça um estúdio com tudo o que é necessário para fazer um filme, desde a filmagem até a montagem e a sonorização.
Godard, aos 80, é um gênio bem sozinho.

Jean-Luc Godard, le pape de la Nouvelle Vague fête ses 80 ans
03/12/2010
Anne CHAON
Jean-Luc Godard, le jeune homme de la Nouvelle vague qui révolutionna le cinéma, fête vendredi ses 80 ans dans son village suisse de Rolle: 50 ans après "A bout de souffle", son nom continue d'inspirer d'Almodovar à Tarantino.
La mine défraichie, mal rasé, mal fagotté, il fait semblant de se terrer dans le canton de Vaud. Mais en réalité, Godard n'a jamais cessé de travailler et son oeuvre réapparaît régulièrement en Une de l'actualité cinématographique mondiale.
En mai, il figurait encore à l'affiche du festival de Cannes avec la présentation de son dernier long-métrage, "Film Socialisme".
Fin novembre, c'est Hollywood qui lui rendait hommage en lui décernant un Oscar d'honneur pour l'ensemble de sa carrière, marquée par des films comme "A bout de souffle" avec Jean Seberg et Jean-Paul Belmondo, "Le Mépris" avec Brigitte Bardot ou "Alphaville", avec son ancienne épouse Anna Karina.
A Cannes comme à Hollywood, l'ermite de Rolle a refusé de faire le déplacement, conforme à ses choix politiques qui l'ont conduit, depuis 1968 et sa mini-révolution aux marches du Palais des Festivals de Cannes, hors des allées dorées du système.
Godard, comme toute la bande de la Nouvelle Vague, est issu de la revue mythique des "Cahiers du cinéma" avec d'autres grandes figures de ce mouvement cinématographique, comme François Truffaut ou Claude Chabrol, décédé récemment.
Il y règne alors, en ces années 50, un "extraordinaire amour des films et une révolte contre une impression de conformisme du cinéma français", explique l'un de ses anciens directeurs, Jean-Michel Frodon, qui vient de publier une histoire du "Cinéma français, de la Nouvelle Vague à nos jours".
Passé derrière la caméra, Godard a réinventé un langage cinématographique qui continue de servir de fil rouge à des cinéastes aussi différents que David Lynch, Gus van Sant ou Mathieu Amalric qui se sont réappropriés, chacun dans leur style, ses leçons de cinéma, ajoute-t-il.
"Aujourd'hui, on ne peut pas parler 20 minutes avec David Lynch sans qu'il évoque Godard. Ou avec David Cronenberg, Gus van Sant, Jim Jarmusch. Au Brésil, au Japon ou en Chine, tous les cinéastes expliquent que le travail de Godard les aide à réfléchir à leur propre travail", poursuit Jean-Michel Frodon.
Depuis qu'il a filmé les fesses de Brigitte Bardot en brune dans "Le Mépris", la caméra a changé de point de vue sur les corps montrés au cinéma.
Lui qui déteste les hommages rira sans doute de voir les experts en Nouvelle Vague comparer son apport au cinéma à celui de Picasso à la peinture.
"Au milieu des années 60, Godard c'est Picasso: ce sont les deux artistes les plus célèbres du monde entier avec, peut-être, Bob Dylan. On a perdu la mesure de ce qu'il représentait dans l'imaginaire du monde occidental, aux Etats-Unis, en Europe, au Japon... C'est la star de sa génération", assure Jean-Michel Frodon.
Jean-Luc Godard, qui a acquis la nationalité suisse à l'âge de 21 ans, dit qu'il a choisi de s'installer dans le village de Rolle il y a 30 ans avec sa compagne, la réalisatrice Anne-Marie Mieville, parce que c'est "nulle part".
"Les gens le laissent tranquille", dit le maire Daniel Belotti. "Il y a ses habitudes, promène son chien, va au café sur la Grand-Rue, achète son journal, ses cigares" raconte-t-il à l'AFP. "C'est quelqu'un de très simple" ajoute-t-il.

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